QUE GRANDE IDEIA!

Que grande ideia!

Inovações engenhosas que estão a transformar o mundo para melhor. 



 Patricia Pearson 



De soluções médicas a ideias para salvar o planeta, por todo o mundo os grandes cérebros inventam formas de terem um impacto positivo. Aqui ficam algumas das nossas favoritas.





Um sistema de aviso precoce de incêndios florestais 


Todos os anos, os fogos florestais custam caro em todo o mundo. Em 2021, só os Estados Unidos gastaram mais de 4000 milhões de dólares a combater incêndios na natureza. É preciso novas formas de detetar e apagar as chamas antes que fiquem fora de controlo, e é aqui que entra a start-up berlinense Dryad Networks.

A empresa desenvolveu um pequeno sensor a energia solar que pode ser montado nas árvores. Este «nariz eletrónico» pode detetar o hidrogénio, monóxido de carbono e outros compostos que são libertados quando um fogo começa a lavrar, alertando as autoridades por um sinal sem fio antes mesmo de o fumo ser visível acima das árvores.

Num teste recente realizado na Alemanha, o sensor detetou um fogo (propositadamente aceso) em catorze minutos. Também fornece coordenadas de GPS exatas para os bombeiros. Regiões florestais desde a Califórnia até à ilha italiana da Sardenha estão agora a experimentar estes sensores pouco dispendiosos, e a Dryad tem como objetivo colocar 120 milhões no terreno até 2030, evitando que ardam 4 milhões de hectares de terreno.



Um implante cerebral para a paralisia 


Avanços impressionantes em neurotecnologia estão a dar uma verdadeira esperança às pessoas com lesões na coluna vertebral. Um homem conseguiu voltar a andar simplesmente por pensar nisso, graças a uma interface digital cérebro-espinha, criada por investigadores suíços, que estimula os sinais neurais danificados por uma lesão.


Gert-Jan Oskam, um homem de 40 anos dos Países Baixos, anda de cadeira de rodas desde que ficou paralisado num acidente de bicicleta há doze anos. Mas os implantes eletrónicos que lhe foram colocados no cérebro permitem-lhe agora transmitir as suas intenções, sem falar, a um recetor que tem implantado na coluna vertebral. O implante amplifica e envia os sinais para as pernas e os pés através das células nervosas. «Sinto-me como uma criança a aprender a andar de novo», disse Oskam à BBC News. O mecanismo ainda está em fase experimental, mas os especialistas dizem que a investigação é muito encorajadora. 



Roupa impressa em 4D e outras coisas que nos causam espanto 


No que respeita ao que vestimos, a fantasia está prestes a tornar-se realidade graças à impressão 4D. Esta nova tecnologia programa materiais «inteligentes» que, quando impressos em 3D, mudam de forma e cor em resposta a estímulos externos como a água, calor ou luz.

Imagine uma esponja ou um colchão de espuma com memória que se contrai e expande. Estes materiais «inteligentes» funcionam de um modo semelhante, mas a programação torna-os mais intencionais. O vestuário 4D pode ser acionado para se esticar, dobrar, achatar, torcer ou mudar de cor. O exército dos EUA, por exemplo, está a testar uniformes que mudam o padrão de camuflagem dependendo do ambiente em que o soldado se encontra.


Noutras aplicações, os cientistas criaram ajudas de preensão vestíveis para pessoas com restrições na mobilidade dos dedos, stents cardiovasculares que se expandem e contraem com o batimento cardíaco e implantes de tecidos moles concebidos para libertar microdoses de medicamentos.


Quer deitar fora aquelas instruções desconcertantes do IKEA e trocar por móveis que se montam sozinhos? A impressão 4D também pode criar uma placa plana que se encolhe para formar um móvel quando se adiciona calor.

A investigação, conduzida pelo MIT Self-Assembly Lab em Cambridge, no Massachusetts, ainda está a dar os primeiros passos, mas o seu potencial impacto na saúde e na indústria é ilimitado.



Agricultura urbana em altitude 


Tem falta de legumes frescos este inverno? Não é preciso esperar pelas importações da América do Sul: basta dar uma corrida ao escritório para ter um molho de alfaces.

A sério, são cada vez mais os centros urbanos onde é possível fazê-lo. Com mais pessoas a optarem por trabalhar a partir de casa, deixando os espaços de escritório vazios, alguns desses edifícios – muitos deles repletos de luz natural – estão a ser convertidos em quintas de interior verticais.


Empresas como a Agriplay, em Calgary, e a Area 2 Farms, em Washington, DC, resolvem dois problemas de uma vez: arrendam imobiliário subutilizado e fornecem alimentos frescos locais sem dependerem das cadeias de abastecimento globais.


Adicionalmente, a Agriplay utiliza uma técnica de aspersores de precisão sem solo que humedecem as plantas desde a raiz, e luzes LED equipadas com sensores que enviam dados para um sistema dotado de inteligência artificial que se adapta a condições de crescimento específicas. O resultado é até menos 90% de consumo de energia em relação à tradicional agricultura vertical.

Com esse tipo de inovações técnicas, os edifícios de escritórios podem ser transformados em superfábricas de produção de vegetais. A Farm-Zero, com sede em Chicago, está em processo de alugar mais de 279 mil metros quadrados de escritórios com vista a produzir anualmente 27 milhões de quilos de vegetais, ao abrigo das dificuldades da agricultura como a seca ou as inundações. Semear para colher!



Formas de se libertar de abusos 


As pessoas que vivem com um companheiro abusivo têm agora novas formas de enviar um SOS que pode salvar vidas.


A polícia da Coreia do Sul adotou uma campanha chamada «Knock Knock» que permite às vítimas denunciarem discretamente os abusos ligando para o 112 e tocando duas vezes em qualquer número. Isto faz com que o sistema envie uma ligação para o telemóvel através de texto. Quando o utilizador clicar nele, a polícia pode detetar a localização da vítima usando o GPS do telemóvel e até ver uma transmissão em direto do que está a acontecer através da câmara do telemóvel.


Entretanto, uma estudante polaca do ensino secundário está a usar o disfarce das compras online para combater os abusos. Em 2021, Krystyna Paszko lançou uma loja de cosméticos falsa e espalhou a palavra pelos seus contactos nas redes sociais de que é, na verdade, uma tábua de salvação para as vítimas. 


Quando alguém visita a página Chamomiles e Pansies no Facebook para comprar um produto, como um creme, está de facto a contactar com um psicólogo. Se alguém «faz uma encomenda» usando a respetiva morada, é solicitada uma visita ao domicílio pelas autoridades, à semelhança do que aconteceria se a vítima tivesse ligado para a polícia para pedir ajuda. A iniciativa ajudou cerca de 350 pessoas no primeiro ano.



Reconstruir as grandes cidades 


Um pouco de espaço verde pode fazer muito, e Madrid, em Espanha, uma das maiores cidades da Europa, está a apontar o caminho da renaturalização urbana.


Foi preciso quase uma década de construção, mas o projeto Madrid Río transferiu troços da autoestrada M-30 para túneis subterrâneos, permitindo que as pessoas façam piqueniques onde antes passavam carros a grande velocidade. O rio Manzanares, demasiado poluído, foi limpo, ao ponto de as lontras estarem a ser vistas pela primeira vez em anos. A cidade plantou árvores, alargou os cursos de água e criou espaços verdes e praias. 


Após a conclusão do projeto em 2015, um estudo revelou grandes reduções na poluição sonora e atmosférica. Os investigadores estimaram uma redução de mais de 30 mil toneladas de CO2. Uma mulher que vive junto ao rio, Carmen Muñoz, disse a um repórter do Politico que «já não acorda com o barulho das buzinas dos carros mas com o som dos pássaros nas árvores». 

A cidade ainda não terminou. A seguir, planeia rodear-se de uma floresta, plantando cerca de 1,5 milhões de árvores, maioritariamente rebentos. «Iremos construir o que será efetivamente uma floresta metropolitana com 75 quilómetros de comprimento», disse Mariano Fuentes, vereador de Madrid, numa entrevista à revista Geographical. 



Tinta que arrefece 


O hemisfério norte registou o verão mais quente de que há memória no ano passado. Um homem tem uma solução fresca. Xiulin Ruan, professor de Engenharia Mecânica na Universidade de Purdue, no Indiana, criou uma fórmula especial que aumenta o poder de reflexão da tinta branca, reduzindo a temperatura da superfície do telhado até 13 ºC ao meio-dia. 


A tinta de Ruan – que contém elevadas concentrações de sulfato de bário que reflete a luz – pode reduzir as necessidades de ar condicionado até 40%. 


Enquanto a tinta branca normal ajuda a manter a frescura ao refletir 80 a 90% da luz solar, esta formulação reflete 98%. 

Xiulin Ruan espera que a tinta esteja comercialmente disponível este ano. 



Pontos que detetam infeções 


Dasia Taylor tinha apenas 17 anos quando, em 2021, pôs a sua mente inventiva a resolver uma complicação médica muito comum: as infeções após a cirurgia. Dasia Taylor, em colaboração com o seu professor de Química em Iowa City, no Iowa, concebeu suturas que mudam de cor quando se desenvolvem infeções. 

Como funciona? A pele é naturalmente ácida, com um pH de cerca 5. Se houver infeção, os níveis de pH aumentam. Taylor descobriu que alguns vegetais mudam de cor consoante o seu teor de acidez; a beterraba, ao que parece, passa de vermelho vivo para roxo-escuro com um pH de 9. Por isso, tingiu os seus fios de sutura com sumo de beterraba. O fio passa de vermelho a roxo quando uma ferida está infetada. Isto significa que um paciente pode ser tratado rapidamente com antibióticos, debelando a infeção antes que se torne grave. 



Um apanhador de lixo para os oceanos 


Há cerca de 171 triliões de pedaços de plástico a flutuar nos nossos oceanos. O que se pode fazer para acabar com este lixo? O designer industrial alemão Mauritz Schulz concebeu o «TrashBoom», uma espécie de barreira flutuante, semelhante às marcações de uma pista de natação numa piscina, que se estende ao longo de um rio e serve de rede, bloqueando garrafas e sacos antes de serem arrastados para o mar. Até à data, este dispositivo simples é usado principalmente na Indonésia e na Índia – onde já impediu mais de 900 toneladas de lixo de entrarem no oceano desde abril de 2021. As instruções para fazer o TrashBoom estão disponíveis online, e outras organizações estão a aplicar esta tecnologia de distribuição livre e de código aberto. 



Um dispensador de comprimidos que previne a dependência 


A dependência de opiáceos é uma das maiores crises de saúde pública dos nossos tempos. Quando era estudante na Universidade de Nova Iorque, Artin Perse viu que o tio ficou viciado em opiáceos enquanto recuperava dos ferimentos de um acidente de viação. Isso inspirou-o a fazer algo para ajudar a prevenir a dependência, e por isso concebeu um dispositivo que dispensa comprimidos de acordo com a receita do médico. Entre as libertações eletronicamente cronometradas o frasco não pode ser aberto. (Destina-se a pessoas em fases iniciais de controlo da dor, e não a dependentes.) Artin Perse fundou uma empresa, chamada Levl, que usa o mesmo princípio para ajudar as pessoas com os medicamentos psiquiátricos. O dispensador ainda está em fase de teste, mas Perse espera disponibilizá-lo dentro de um ano. 


CONHEÇA O INVENTOR 

Uma ferramenta de diagnóstico com inteligência artificial

 

QUANDO A ESTUDANTE da Universidade de Stanford Ellen Xu, agora com 18 anos, tinha 5 anos e vivia em San Diego, na Califórnia, lembra-se dos pais terem levado a irmã mais nova para o hospital. Kate, de 3 anos, estava gravemente doente: tinha febre, os olhos vermelhos, uma erupção cutânea e as mãos e a língua inchadas. 

No início, os médicos, confusos, pensaram tratar-se de gripe, mas como o seu estado não melhorou os Xu voltaram ao serviço de urgência onde, por acaso, um médico tinha experiência com uma reação inflamatória aguda nos vasos sanguíneos conhecida como doença de Kawasaki. Embora rara, é a principal causa de doença cardíaca adquirida em bebés e crianças, e a sua causa e fatores percussores não são conhecidos. O médico sabia como tratá-la. Administrou-lhe uma dose de imunoglobulina intravenosa e Kate acabou por melhorar sem sofrer danos no coração. Ellen Xu lembra-se de ter ficado curiosa por causa do estado dramático da irmã e ficou espantada com o facto de os adultos não conseguirem responder às suas perguntas acerca da dificuldade em detetar a causa. «Na minha mente, era um mistério», diz. «Era um puzzle que queria resolver.» 

       Uma década mais tarde, querendo participar numa feira de ciências do liceu, teve uma ideia. «E se tivéssemos um médico no nosso bolso?» E foi exatamente isso que criou: recorrendo à inteligência artificial (IA), Ellen Xu concebeu um algoritmo que utiliza dados visuais para diagnosticar a doença de Kawasaki com base em cinco sintomas físicos. 

A tecnologia funciona da mesma forma que as aplicações que permitem identificar aves e plantas com fotografias tiradas no telemóvel. Os pais podem carregar uma fotografia do filho e a tecnologia irá procurar na imagem os sintomas da doença de Kawasaki, que muitas vezes têm uma forte componente visual, como uma erupção cutânea ou a língua inchada. A invenção de Ellen Xu foi implementada como aplicação Web no site da Fundação para a Doença de Kawasaki. 

     «A tecnologia também poderia ser desenvolvida para o reconhecimento de doenças autoimunes e reumatológicas», explica. «É muito importante para mim. Quero utilizar a IA para ajudar as pessoas a viverem mais felizes e saudáveis.»



CONHEÇA OS INVENTORES 

Cogumelos para vencer 


QUANDO OS recém-licenciados em Ciências David Brown e Natasha Jean se conheceram em Fredericton, New Brunswick, estavam conscientes de quão maus para o nosso corpo podem ser os conservantes dos alimentos que se vendem no supermercado. O propionato de cálcio, por exemplo, impede que o pão ganhe bolor ao matar as bactérias e leveduras mas também tem sido associado a um risco elevado de diabetes e obesidade. 

Depois de lerem um estudo sobre a capacidade da fibra do cogumelo para preservar os alimentos, atuando como agente antimicrobiano, os dois amigos ficaram intrigados. Com o objetivo de desenvolver um conservante sem químicos, compraram hastes de cogumelos a agricultores que, de outra forma, as deitariam fora. 

Sete anos mais tarde, em 2023, a sua empresa, Chinova Bioworks, 

lançou um extrato de fibra de cogumelo que, quando adicionado aos alimentos, como produtos lácteos, aumenta o prazo de validade e cujo sabor é indetetável. 

A empresa está mesmo a testar o conservante em adegas na Califórnia e na Nova Zelândia. «O produto poderia substituir os sulfitos de que os produtores de vinho dependem para uma vida útil longa», diz Brown. As uvas produzem naturalmente sulfitos, pelo que aquele que é adicionado é uma sobrecarga que algumas pessoas não conseguem tolerar. 

É uma situação com benefícios para todos: para o clima, para a nossa saúde e para os produtores de cogumelos, que podem vender os seus resíduos. «Esperamos tornar a indústria alimentar mais sustentável», refere Brown.


CONHEÇA O INVENTOR 

Aproveitar a água limpa do nevoeiro 


QUANDO O ENGENHEIRO INDUSTRIAL Abel Cruz era miúdo, a sua tarefa semanal era descer uma ravina no sopé dos Andes peruanos para ir buscar água para a família a uma nascente. «Era a jusante da casa, muito longe e íngreme», diz ele. Cruz começou a pensar em melhores formas de recolher a água, reparando que as plantas subtropicais, por exemplo, captam a chuva e a neblina com as suas folhas largas. Por fim, teve a ideia de uma rede de nevoeiro. Cada rede vertical tem 20 metros quadrados de malha de resina sintética, onde microgotas de água se condensam e correm para tanques de recolha. Uma rede pode recolher 200 a 400 litros por dia. Trabalhando em Lima com o apoio da Creating Water Foundation, Cruz instalou mais de 3600 redes nas encostas da cidade para captar o nevoeiro que vem do oceano Pacífico. Com uma população de mais de 9 milhões de habitantes, Lima sofre frequentemente de graves carências de água devido ao seu clima árido. «O planeta tem cada vez menos água doce», salienta Cruz, porque |«os glaciares, que são reservatórios naturais, estão a desaparecer. Por isso, temos de encontrar uma forma de acumular e poupar água para os períodos de seca». 


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