Solução tecnológica que usa a energia do sol para climatização, ventilação, aquecimento de águas quentes sanitárias, aquecimento de piscinas, secagem de roupa, secagem de mãos ou saunas… Permite reduzir cerca de 90% da fatura energética dos edifícios.
OS NÚMEROS NÃO ENGANAM: a população mundial consome mais 30% de recursos do que é capaz de produzir. E esse consumo é ainda esmagadoramente assente em indústrias dependentes do petróleo. Entre 2011 e 2013, os países da União Europeia, no seu todo, gastaram mil milhões de euros por dia em petróleo importado. Isto sem contar com o custo do carvão e do gás natural. No entanto, a maioria dos países continua a não aproveitar uma fonte energética inesgotável e gratuita: o sol.
Foi a pensar neste problema que nasceu o Senergy Force, um sistema de captação de energia solar que reúne numa única solução todas as utilizações da energia solar: climatização, ventilação e aquecimento de água para utilização nos sanitários.
Desenvolvido pela T&T, uma empresa de Vouzela, com o apoio do departamento de mecânica da Universidade de Aveiro, o Senergy Force apresenta-se como a solução mais avançada no mundo da climatização.
«Numa altura em que se fala tanto das questões climáticas, da escassez de recursos naturais, esta solução aproveita o que o planeta nos dá de forma gratuita e que continuamos a desperdiçar, a energia do sol», revela Augusto Teixeira, diretor da T&T e criador do Senergy Force.
O empresário inspirou-se nos estudos do padre Manuel António Gomes, mais conhecido como «Padre Himalaya », cujos trabalhos científicos sobre o potencial da energia do sol deram que falar na Exposição Universal de Saint Louis, nos Estados Unidos, em 1904.
«Ele era um cientista à frente do seu tempo, fez estudos notáveis na área da energia solar e foi responsável pela introdução em Portugal das energias renováveis. Defendia que um dia de sol nos dava a energia de que precisamos para um ano. Acredito que esta solução vai mudar o mundo, vai alterar completamente a forma como as casas são construídas e a forma como são climatizadas, reduzindo o consumo de energias fósseis, e aproveitando toda a energia que a natureza e o sol nos dão», salienta Augusto Teixeira.
Na prática, aquilo que Augusto Teixeira propõe é um sistema de climatização que pode ser parte de um edifício, fachadas, paredes ou telhados, com um rendimento de 90% e ganhos superiores a 20%, comparativamente com os sistemas tradicionais.
«O que criámos foi uma fachada energética composta por módulos solares. Não são painéis solares ou fotovoltaicos tradicionais, que produzem eletricidade ou aquecem água. Os painéis tradicionais têm um problema de sobreaquecimento em dias de forte exposição solar, o que os pode levar a rebentar, a ganhar fugas ou a queimar isolamento, e consequentemente a deixar de funcionar. Fizemos várias experiências e chegámos à conclusão de que a temperatura incidente em cada painel podia circular de painel para painel, em sistema aberto, de modo que o calor em excesso, no verão, seja dissipado como se fosse uma fachada ventilada», explica às Selecções do Reader’s Digest Augusto Teixeira.
Com a chave da solução na mão, Augusto Teixeira criou o Centro Português de Sustentabilidade (CPS), em Campia, Vouzela, que visa ser um espaço de demonstração de várias tecnologias e que une a inovação e a sustentabilidade,como se de uma casa de habitação se tratasse, recorrendo às energias renováveis e a materiais ecológicos. O Senergy Force constitui o projeto de fachada energética.
«Aqui no CPS, aplicamos este sistema na fachada sul, numa parede inclinada a 60°, que funciona em conjugação com a captação geotérmica do ar, por convecção interna, como se fosse o pano de uma lareira, tanto para quente como para frio, renovando também o ar do interior da casa. No verão permite ter ar fresco, e no inverno ar quente. Em termos médios, a temperatura interna está nos 24°C», explica Augusto Teixeira enquanto visitamos o CPS.
A posição da fachada tem sempre a ver com a posição do sol, e o seu tamanho depende da área que se pretende climatizar. Para uma área de 1200 m2, por exemplo, a fachada deverá ter 200m2. Segundo Augusto Teixeira, a fachada deve ocupar entre 15% a 20% do espaço que se pretende climatizar. Com a conjugação das várias tecnologias instaladas no CPS, Augusto Teixeira acredita que uma habitação que as possua conseguirá produzir 90% das suas necessidades energéticas.
A juntar ao Senergy Force, existe ainda a bateria térmica. Trata-se de um acumulador de inércia térmica assente em dois reservatórios de água, com um total de 3500 litros de água, e que tem como finalidade acumular o calor proveniente da fachada energética para posterior utilização, nomeadamente de noite ou nos dias marcados por nebulosidade.
Esta água pode também ajudar a manter a temperatura ambiente através do piso radiante. E as mesmas águas podem estar ligadas ao chuveiro ao lavatório ou a uma piscina.
Ao mesmo tempo, e sempre a pensar na sustentabilidade, a casa-modelo do CPS dispõe de um terraço para aproveitamento de águas da chuva para os sanitários, nomeadamente para as sanitas, economizando assim água da rede potável. Outra das áreas da casa sustentável é o sistema de tratamento de águas residuais, que compreende três etapas sequenciais, inspiradas nos processos sustentáveis que ocorrem nos rios. «Primeiro temos um reservatório de decantação primária, que separa os resíduos sólidos, que ficam no fundo, dos resíduos flutuantes. A água segue depois para um reservatório de digestão aeróbia, biológica, de lodo, ativado com oxigenação prolongada. E termina no reservatório de decantação secundária ou de clareamento, e daqui pode ser usada na rega de pequenas hortas ou árvores», explica Augusto Teixeira.
Augusto Teixeira, o inventor desta tecnologia e deste conceito de casa sustentável, prevê que em cinco anos esta solução esteja a ser comercializada em vários mercados e em quantidades na ordem das 45 mil unidades/ano, gerando resultados de cerca de três milhões de euros anuais. A primeira instalação desta tecnologia foi vendida para uma moradia unifamiliar que deverá estar concluída no Belas Clube de Campo, em Sintra, em setembro deste ano.
A T&T está a começar a produção da solução completa para pôr no mercado dentro de dois meses, e está já a dar apoio às dezenas de pedidos específicos que chegam todos os dias. Está ainda à procura de investidores para montagem da primeira fábrica em Portugal, para responder às expectativas do mercado, onde se espera um crescimento exponencial.
Segundo Augusto Teixeira, esta é a melhor solução entre custo e benefício para responder à diretiva europeia 31/2010, conhecida como «diretiva do balanço zero», e que deverá transitar para o direito nacional ainda este ano, obrigando a que todos os edifícios novos, ou com reconstruções profundas, produzam a mesma quantidade de energia que consomem. Isto exige uma mudança completa do paradigma da energia e da climatização.