UMA MANHÃ, EM NOVEMBRO PASSADO, INGALILL EKBERG acordou com uma dormência estranha nos dois braços O marido estava fora e a economista de 57 anos, de Linköping, na Suécia, tinha dormido mal De pé na casa de banho foi subitamente assaltada por náuseas, tonturas, e uma pressão no peito. Começou a suar. «Talvez seja gripe», pensou, ou talvez uma reação a um medicamento novo para a tensão alta. Ligou para o 1177, a linha de informação de saúde não-urgente da Suécia.
A mãe de três filhos crescidos não fazia ideia de que estava a ter um ataque cardíaco – não tinha peso a mais ou diabetes, nunca fumara, comia muita fruta e vegetais e fazia exercício regular. «Mas quando descrevi os meus sintomas a enfermeira disse: “Vou chamar imediatamente uma ambulância.”» Não tinha dores, mas tinha falta de ar. Os paramédicos chegaram em minutos e ligaram-na a um monitor cardíaco. Era evidente: estava a ter um enfarte do miocárdio, um ataque de coração causado pela obstrução de um vaso no coração. Em 45 minutos estava no Hospital da Universidade de Linköping a ter um cateter inserido para desobstruir a artéria entupida e restabelecer o fluxo de sangue para o coração.
Mais tarde, dois cardiologistas examinaram o músculo do coração em busca de danos e ficaram espantados – o seu socorro fora tão rápido que não tinha ocorrido nenhum. «Como é que soube tão depressa que estava a ter um ataque de coração?», perguntaram-lhe. «Não soube», disse Ingalill, que agora está recuperada. «Mas, graças a Deus, soube a enfermeira. Agora sinto-me bem como não sentia desde há muitos meses.»
Mas outras não tiveram tanta sorte. Para Jany de Pijper, de 59 anos, de Strijen, na Holanda, o aviso duas semanas antes do ataque de coração em março de 2011 foi uma súbita falta de ar. Tentou levar o cão à rua mas não conseguia respirar. Passou 24 horas num hospital, com um monitor cardíaco, mas disseram-lhe que não viam nada de mal e enviaram-na para casa. Quando o grande ataque de coração ocorreu, descobriram que a sua artéria coronária esquerda estava bloqueada e que já tinha tido dois ataques «silenciosos» nas semanas anteriores.
O ataque foi sério e teve efeitos secundários, e ficou com mazelas persistentes. «Estou grata por estar viva, mas já não posso trabalhar, e, no princípio de cada semana, encho uma caixa com comprimidos para tomar todos os dias. Tive de perder peso e não posso comer sal nem gordura. Não tenho muita energia e preciso de descansar com frequência.»
Todos os anos na Europa cerca de 910 000 mulheres morrem de doenças do coração – são três mulheres a cada dois minutos. Há hoje, todos os anos, mais 30 000 mortes por doenças do coração nas mulheres do que nos homens e cerca de sete vezes mais mortes anuais de doenças do coração do que de cancro da mama. No entanto, de acordo com a Sociedade Europeia de Cardiologia (SEC), a maior parte das mulheres ainda considera as doenças cardiovasculares um problema que atinge principalmente os homens.
«As mulheres têm mais fatores de risco do que os homens, mas muitas não o sabem», diz a professora Eva Swahn, cardiologista sueca e uma das principais porta-vozes da SEC sobre mulheres e doenças do coração.
Eis sete factos novos sobre os ataques de coração femininos que todas as mulheres precisam de conhecer.
❤ FACTO 1: Os avisos iniciais podem aparecer com meses de antecedência.
Estudos na Noruega, Canadá e EUA concluíram que a maioria das mulheres relata um número chave de sintomas por vezes até um ano antes do ataque de coração. Os sintomas mais típicos são fadiga, perturbações no sono e falta de ar. Outros são ansiedade, indigestão, períodos de dormência nos braços, e dores no peito, maxilar, costas, braços ou pernas.
Uma fadiga fora de comum assolou Ingalill Ekberg. «Não me sentia a mesma desde o verão», lembra. Agora sabe que a sua fadiga era provavelmente um sinal precoce de que o fluxo de sangue para o seu coração estava restringido.
❤ FACTO 2: Os exames normais podem não detetar o problema.
O fluxo reduzido de sangue no coração, chamado isquemia, já foi há muito atribuído ao acumular de típicos bloqueios de placas nos grandes vasos que alimentam o coração. É essa a causa da maioria dos ataques de coração em homens e mulheres com idades acima dos 75 anos. Mas é agora certo que a isquemia pode ter causas diversas, especialmente vasos estreitos ou rígidos no coração que restringem o fluxo de sangue. Um estudo importante feito na década passada, de Avaliação da Síndrome de Isquemia em Mulheres nos EUA, concluiu que até 50% das mulheres com dores no peito, falta de ar e provas de esforço com maus resultados não revelaram bloqueios em angiogramas normais (imagens das grandes artérias). «Estamos a descobrir que as mulheres de meia-idade não têm a típica aterosclerose (estreitamento das artérias), mas têm de facto anomalias cardíacas», diz a Dr.ª Angela Maas, professora de Saúde Cardíaca Feminina no Centro Médico da Universidade de Radboud, em Nijmegen, Holanda. Dori Naerbo, de Sirevaag, na Noruega, no seu livro de 2013 Um Ataque de Coração de Mulher, descreve os seus três ataques de coração em três meses aos 47 anos, explicando nenhum bloqueio foi encontrado nos angiogramas, mas os testes da enzima cardíaca mostraram que tinham ocorrido danos no músculo do coração devido à falta de fluxo sanguíneo.
Estes dados novos podem ajudar a explicar porque é que o diagnóstico de algumas mulheres que sofrem ataques de coração pode falhar em exames normais.
❤ FACTO 3: Ataques de coração aumentam em mulheres de meia-idade.
Devido ao efeito protetor do estrogénio, a maioria das mulheres desenvolve ataques de coração em média sete a dez anos mais tarde do que os homens, normalmente depois da menopausa, com maior incidência depois dos 70 anos. Mas estudos mostram que, nas últimas duas décadas, o número de ataques em mulheres de meia-idade (35-54 anos) tem aumentado, enquanto o número em homens da mesma idade tem reduzido. Esta mudança pode estar relacionada com o aumento da incidência nas mulheres de fatores-chave de risco para o ataque de coração: tabaco, diabetes, hipertensão, obesidade e sedentarismo. «Estilos de vida piores para as mulheres traduzem-se em mais enfartes do miocárdio em idades mais precoces», diz a Dr.ª Maas.
❤ FACTO 4: As mulheres têm fatores de risco únicos e significativos.
Os fatores-chave de risco nas mulheres e homens são os mesmos, mas o tabaco e a diabetes duplicam o risco de ataque de coração nas mulheres, em relação aos homens. E as mulheres têm alguns fatores de risco significativos que os homens não têm. Complicações durante a gravidez, principalmente pré-eclâmpsia (hipertensão e proteína na urina), aumentam substancialmente o risco de doenças de coração futuras. Outros fatores de risco são a diabetes gestacional e a restrição do crescimento intrauterino da criança.
Os fatores de risco exclusivos das mulheres também incluem menopausa precoce (antes dos 40) e sintomas de menopausa para lá dos 55 anos, como afrontamentos persistentes. «Estes podem ser indicação precoce de anormalidade cardiovascular subjacente», explica a Dr.ª Maas. Uma doença chamada Síndroma dos Ovários Policísticos, que causa infertilidade, aumento de peso e menstruação irregular, também aumenta o risco de doença do coração.
Infelizmente, as mulheres que sobrevivem ao cancro da mama também têm maior risco de doenças de coração futuras, nota a Dr.ª Maas, relacionadas com alguns tratamentos de cancro como radioterapia e certas quimioterapias, e aumentam os indícios de que o gene BRCA subjacente pode promover danos cardíacos. As mulheres devem focar-se nos fatores de risco que podem controlar, como a dieta, exercício, tabaco, peso e tensão arterial, dizem a Dr.ª Maas e a professora Swahn.
❤ FACTO 5: A síndrome do coração partido pode ser perigosa.
Investigadores japoneses em 1990 foram os primeiros a identificar uma doença de coração perigosa, mas temporária, frequentemente provocada por stress extremo, desgosto ou choque, que é cerca de nove vezes mais frequente nas mulheres pós-menopausa do que nos homens. Chama-se «síndroma do coração partido» ou cardiomiopatia de Takotsubo devido à característica aparência de balão do ventrículo esquerdo. A doença interfere com o batimento cardíaco e pode causar sintomas de ataque de coração e alterações em ECG. Mas não existe bloqueio de artérias. A síndrome está a ser cada vez mais identificada em pacientes e estão a decorrer estudos em todo o mundo, incluindo no Imperial College, em Londres, para descobrir a sua causa. De momento, o melhor conselho é tratar os pacientes com medicações cardíacas normais como betabloqueadores e inibidores de ACE e mantê-los no hospital uma semana. As anormalidades desaparecem entre uma a quatro semanas, e a maior parte dos pacientes recupera completamente em dois meses.
❤ FACTO 6: Uma fissura ou inchaço numa artéria podem cortar o fluxo sanguíneo.
Rebecca Breslin, de Melton Mowbray, Leicestershire, Reino Unido, tinha apenas 34 anos, estava em forma e era saudável quando acordou em março de 2012 a sentir uma pressão no peito e com dificuldade em respirar. Quando voltou a acordar tinha uma dor intensa no braço esquerdo que chegava ao maxilar. Como Rebecca fazia testes clínicos para medicamentos para o coração, reconheceu estes sinais de ataque cardíaco. Mas porque é que aquilo lhe estava a acontecer?
Levada para o hospital, acabou por ser diagnosticada com uma «dissecção espontânea da artéria coronária», ou DEAC, em que uma fissura ou inchaço de uma das artérias coronárias corta o fluxo sanguíneo. Rebecca passou 18 dias no hospital até a sua saúde estabilizar. Ao ter alta do hospital, Rebecca foi integrada num programa de reabilitação cardíaca. «Dou graças por ter estado num bom hospital que oferecia esse serviço. O importante era não pegar em nada pesado, e ir com calma, mas voltar a fazer exercício começando por caminhar», diz Rebecca. «A minha recuperação tem sido mesmo boa. Tenho tido muita sorte. Não voltei a ter problemas desde então.» Agora está a ajudar pacientes de DEAC a entrarem num estudo sobre a doença.
Setenta por cento dos doentes de DEAC são mulheres, apenas 30 por cento são homens, e a doença normalmente ocorre entre os 30 e os 40 anos. O Dr. David Adlam, da Unidade de Pesquisa Cardiovascular Biomédica de Leicester, no Reino Unido, lidera o braço europeu da investigação, em concertação com um estudo semelhante na América do Norte, na Clínica Mayo. «Penso que muitas mulheres e homens com DEAC passam despercebidos», diz o Dr. Adlam. «Só agora começamos a ter as novas tecnologias como a Tomografia de Coerência Ótica, uma ferramenta de criação de imagens de alta resolução que pode recolher imagens mais detalhadas dentro das artérias e visualizar a doença.»
❤ FACTO 7: Acredite nos seus sintomas e seja a sua própria defensora.
Apesar de o conhecimento sobre os ataques de coração nas mulheres ter melhorado imenso na última década, tanto a professora Swahn como a Dr.ª Maas afirmam que é necessária mais investigação, são precisas mais voluntárias para pesquisas de investigação e as mulheres precisam de levar os seus riscos e quaisquer sintomas a sério. Mesmo as mais de 75 por cento das mulheres que têm o conhecido sintoma da dor no peito o desvalorizam porque presumem que não pode ser um ataque cardíaco, diz a professora Swahn.
«Cada uma tem de ser a sua melhor defensora», apela a Dr.ª Maas, enquanto a professora Swahn sublinha: «Tem de acreditar nos seus sintomas, e fazer os outros também acreditarem neles.»