No verão passado, numa sexta-feira à noite, María Menéndez apercebeu-se de que tinha uma erupção cutânea nas costas mas não deu muita importância ao assunto. No sábado, a erupção espalhou-se e no domingo tinham-se formado aglomerados de bolhas que provocavam dor e muita comichão. Apesar da dor e do desconforto, María foi trabalhar na segunda-feira, mas acabou por ir às urgências à hora do almoço porque a dor tornou-se insuportável.
«Assim que me viu, o médico diagnosticou herpes zóster, também designado zona», explica María, de 57 anos, natural de Vigo, em Espanha.
Existem duas vacinas para a zona – Zostavax e Shingrix – autorizadas na União Europeia para indivíduos com mais de 50 anos, mas os médicos nunca falaram disso a María. Nem estas vacinas estão na lista de recomendações das autoridades de saúde espanholas e, ao que tudo indica, os médicos que María consultou não sabiam da sua existência.
As vacinas previnem muitas doenças infeciosas, e não apenas nas crianças: as que são recomendadas a adultos incluem, entre outras, a herpes zóster, que é responsável pela zona, uma doença invasiva pneumocócica, embora a lista varie de país para país. É evidente que a COVID-19 tem estado na ordem do dia este ano, mas vai demorar algum tempo até que exista uma vacina (à data da publicação deste artigo, estima-se que ainda demore um ano até que esteja disponível). No entanto, existe uma série de vacinas que protegem de outras doenças – e muitas pessoas podiam tirar partido delas. A razão tem que ver com o facto de as vacinas serem recomendadas e não obrigatórias. Assim, as pessoas podem optar pela não vacinação. Também se pode dar o caso de a pessoa que lhe garante os cuidados de saúde não conhecer as vacinas disponíveis. E isso é tanto mais grave quanto se espera que o seu médico saiba o que é melhor para si.
«A maior parte dos adultos não faz ideia de qual é o estado das suas vacinas – confiam no médico que os segue», resume a Dra. Katherine O’Brien, diretora de imunização, vacinas e produtos biológicos da Organização Mundial da Saúde, em Genebra. «As pessoas assumem que o médico é alguém que está sempre informado e atento.»
Na maioria dos países da União Europeia, fazer o seguimento das vacinas que lhe foram ministradas é da sua responsabilidade, o que dificulta que esteja sempre atualizado.
«É difícil manter o registo do que já se apanhou e quando… especialmente se se mudar. Hoje em dia, as pessoas mudam-se muito e mudam de médico», diz a Dra. Kari Johansen, especialista em doenças preveníveis por vacinas no Centro Europeu de Prevenção de Doenças (ECDC, na sigla em inglês), em Estocolmo. «A informação acerca das vacinas que lhe foram administradas, contra que doenças e quando nem sempre vai consigo.»
Eis o que deve saber sobre as vacinas para os adultos:
Zona (herpes zóster)
Se teve varicela em pequeno, o vírus nunca o deixou completamente. Pode sair do estado de hibernação e expressar-se como zona, que afeta os nervos por detrás das áreas onde as bolhas aparecem, causando muitas dores. Depois de ter sido diagnosticada, enquanto ainda tomava a medicação para tratar a zona, María Menéndez teve que enfrentar sintomas indesejados. «Os primeiros três dias foram muito dolorosos, não suportava sequer o toque da roupa na pele», recorda María.
A zona pode também ser dolorosa depois da recuperação. «As nevralgias pós-herpéticas podem durar meses», explica o Dr. William Schaffner, professor de Medicina Preventiva e Doenças Infeciosas na Faculdade de Medicina da Universidade Vanderbilt, em Nashville, no Tennessee. «O objetivo da vacina da herpes zóster é, sobretudo, prevenir as lesões da pele, que por vezes podem afetar os olhos e ameaçar a visão e/ou a audição. Além disso, o que também é muito importante, a vacina previne as nevralgias pós-herpéticas.»
Em 2006, a Agência Europeia do Medicamento aprovou a vacina anti-herpes zóster Zostavax e, em 2008, a Shingrix, que oferece níveis ainda maiores de proteção. No mundo, tem uma distribuição limitada – na Europa, está apenas disponível na Alemanha e não tem distribuição no Reino Unido –, mas a Zostavax está amplamente disponível. Apesar disso, são poucos os europeus protegidos: apenas seis países na União Europeia (Áustria, República Checa, França, Alemanha, Grécia e Itália) e o Reino Unido recomendam a vacinação contra a zona.
«No sistema privado, qualquer pessoa pode comprar a Zostavax», diz a Dra. Kari Johansen. Mas esta especialista acredita que o que leva muitas pessoas a não a comprarem é o facto de os europeus estarem mal habituados: na maior parte do continente algumas vacinas são gratuitas, por isso as pessoas apenas tomam essas.
Gripe
Todos os anos, entre 4 a 50 milhões de pessoas contraem gripe na União Europeia e no Espaço Económico Europeu, e entre 15 mil a 70 mil acabam por falecer dessa causa, segundo números do ECDC. A gripe ataca pessoas de todas as idades, mas as que têm mais de 65 anos têm mais probabilidades de serem hospitalizadas ou desenvolver complicações. Por esta razão, todos os países da União Europeia recomendam a vacina da gripe anual aos adultos com mais de 65 anos. No entanto, mesmo com todas as recomendações, a forma como cada país implementa o seu plano varia, e alguns não financiam esta vacinação.
«Durante muitos anos, os países com as melhores práticas de vacinação contra a gripe na população idosa, e não apenas a que residia em lares, foram os Países Baixos e o Reino Unido», explica a Dra. Kari Johansen. Segundo a OCDE, o Reino Unido tem uma taxa de vacinação contra a gripe de mais de 70% para quem tem 65 ou mais anos, e na Holanda a taxa é de 64%. No fim da lista está a Estónia, onde menos de 5% da população idosa recebe a vacina da gripe. A vacina da gripe não se destina apenas a seniores fragilizados: a sua toma tem vantagens para todos.
«Se tomar a vacina mas ainda assim contrair gripe, há boas probabilidades de que a infeção seja menos grave: isto significa que terá menos probabilidades ter complicações como a pneumonia, ter que ir às urgências, ficar internado – e é menos provável que morra», esclarece o Dr. William Schaffner. «E há um benefício adicional: é menos provável que espalhe o vírus da influenza e, como costumo dizer, ninguém gosta de andar por aí a espalhar coisas más.»
Doença pneumocócica
Apesar de ter tido uma pneumonia pneumocócica, uma infeção bacteriana, há cinco anos, Judy Segaloff não se apercebeu de que voltou a desenvolver a doença no ano passado. Foi preciso consultar três médicos diferentes até chegar a um diagnóstico.
«Sentia dores constantes nas costas e tosse seca», recorda Judy, de 60 anos, residente em Karnei Shomron, em Israel. «Como tenho asma, os médicos presumiram que era essa a causa da tosse.»
A vacina pneumocócica, geralmente recomendada para adultos com 65 ou mais anos, pode ser administrada a adultos mais jovens com determinadas patologias, incluindo problemas pulmonares – só que os médicos não falaram da vacina a Judy.
«Toda a publicidade é pouca à importância da vacinação pneumocócica nos mais velhos», diz Godwin Oligbu, investigador na Divisão de Imunização e Contramedidas de Saúde Pública, em Inglaterra. «Os adultos mais velhos têm o sistema imunitário com tendência a fragilizar, o que os torna suscetíveis a infeções.»
Várias dessas infeções podem ser prevenidas com esta vacina. «Estas bactérias, chamadas pneumococos, podem causar septicemia e meningite, otite e pneumonia, portanto a vacina protege mais do que apenas da pneumonia», explica a Dra. Kari Johansen.
Tomar esta vacina juntamente com outra pode ajudar a mantê-lo mais saudável.
«A pneumonia pneumocócica é uma das principais complicações decorrentes da gripe», explica o Dr. William Schaffner, «portanto, a vacina contra a gripe juntamente com a pneumocócica são uma excelente forma de ajudar a evitar a pneumonia – que costuma ser muito perigosa nas pessoas mais velhas.»
Sarampo
Se nasceu antes da década de 1960, o mais certo é ter tido aquelas borbulhas vermelhas e as manchas típicas do sarampo e estar protegido da doença.
No entanto, de acordo com a Dra. Kari Johansen, apesar de os países europeus terem começado a vacinar contra o sarampo na década de 1960, alguns pararam as campanhas de vacinação durante a década de 1970 e até ao início da de 1980, enquanto outros ministraram apenas uma dose da vacina, quando são necessárias duas. Mais recentemente, os pais «anti-vacinas» escolheram não vacinar os seus filhos, o que tem conduzido à quebra da imunidade de grupo e ao recrudescimento de casos de sarampo na Europa nos últimos anos.
«O vírus do sarampo é o mais contagioso que conhecemos – por exemplo, transmite-se com mais facilidade que os coronavírus», esclarece o Dr. William Schaffner. «O sarampo era uma fonte de sofrimento para as crianças no mundo ocidental e ainda é um problema nos países subdesenvolvidos.»
Alex Sauer, de 38 anos, natural de Colónia, na Alemanha, foi vacinado em criança, por isso ficou surpreendido quando, há dois anos, lhe diagnosticaram sarampo. O sarampo provocou-lhe febre alta, fadiga e conjuntivite, que lhe danificou a visão: atualmente precisa de usar óculos. «Estive doente durante quatro semanas», conta Alex.