Aí partilharam a refeição conhecida na história como «a Última Ceia». Jesus deu à refeição um significado totalmente novo. Houve um tão alto nível de partilha com ele, que, após a sua morte, a refeição se tornou para os discípulos um símbolo permanente da sua ligação com o Senhor: ela continuaria sempre a ser representada como «a Ceia do Senhor».
Segundo João 13,3-15, no início da refeição Jesus deu um exemplo aos discípulos, ao trocar o seu papel de mestre e senhor pelo de um escravo doméstico: embrulhou-se numa toalha, deitou água numa bacia e começou a lavar-lhes os pés. Quando os discípulos, não souberam como reagir, Jesus esclareceu o paradigma de serviço que pretendia mostrar-lhes: «Ora se Eu vos lavei os pés, sendo Senhor e Mestre, também vós deveis lavar os pés uns aos outros.»
A parte da refeição que se tornaria o fulcro do culto cristão é descrita nos relatos de Mateus, Marcos e Lucas. Em determinada altura da ceia, Jesus tomou o pão sem fermento, deu graças a Deus, partiu-o e deu-o aos seus discípulos, dizendo: «Isto é o Meu corpo.» Depois, tomou o cálice com vinho, deu graças, passou-o a todos para que bebessem e disse: «Isto é o Meu sangue, sangue da aliança, que vai ser derramado por muitos.» (Marcos 14,22-24)
Para estes discípulos, a celebração pascal dessa libertação nunca mais seria a mesma. A festa de comemoração do passado passara a apontar para o futuro, e, segundo Marcos, Jesus realçava esse futuro ao dizer aos apóstolos: «Em verdade vos digo: já não beberei do produto da videira até àquele dia em que o hei de beber de novo no reino de Deus.»
A Páscoa constitui em geral uma ocasião festiva, um dos mais estimados pontos altos do ano. O Talmude considera-a «tão saborosa como a azeitona». Mas aquela noite foi caracterizada por pensamentos sombrios. Jesus falou da sua morte próxima e, num momento terrivelmente transparente, anunciou que alguém, presente na sala, o iria trair. Seria o homem que «mete Comigo a mão no prato». Quando Judas pegou num pedaço de pão — da própria mão de Jesus, segundo João —, não houve qualquer exclamação. Mais uma vez, os discípulos pareciam incapazes de compreender o que estava acontecendo. Jesus, aceitando conscientemente o inevitável, disse a Judas: «O que tens a fazer, fá-lo depressa, sem demorar.» Judas saiu imediatamente.
Nos momentos de terno companheirismo que se seguiram à saída de Judas, Jesus falou do amor que os discípulos deviam ter uns pelos outros. Durante a ceia eles estariam provavelmente reclinados à maneira romana. Tranquilos, concentrados, assimilando os pensamentos do Mestre enquanto as lamparinas de azeite tremeluziam na noite fresca de primavera, faziam perguntas a Jesus e professavam-lhe uma lealdade firme. Jesus predisse que, pelo contrário, o seu devotado Simão Pedro, embora tivesse manifestado a sua disposição para morrer por ele, negaria por três vezes conhecê-lo, antes que o galo cantasse, na manhã seguinte. Era evidente que o ritmo dos acontecimentos estava a apressar-se.
Nestas últimas horas, Jesus centrou a atenção dos apóstolos sobre aquilo que lhes poderia dar alento: deviam aprender a encontrar grandeza e autoridade, servindo; deviam apoiar-se, em todas as dificuldades, na confiança num reino que seria o dom de Deus; deviam acreditar que Jesus voltaria ao meio deles e confiar no Espírito Santo para os guiar depois de ele partir.
Numa extensa preleção, referida por João, Jesus ordenou aos seus discípulos: «Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei. Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos seus amigos. Vós sereis Meus amigos se fizerdes o que vos mando.» O caminho ser-lhes-ia penoso, mas Jesus prometeu- -lhes uma paz profunda e inabalável. «No mundo tereis aflições», disse-lhes, como alguém que vai ser traído, «mas tende confiança! Eu venci o mundo».
Então, conta João, Jesus, «levantando os olhos ao céu», rezou pelos apóstolos, que ia enviar para o mundo, como seu pai o enviara ao mundo. «Santifica-os na verdade», rogou, «a Tua palavra é a verdade». Orou também por aqueles que acreditariam nele através da palavra dos apóstolos, «para que todos sejam um só; como Tu, ó Pai, estás em Mim e Eu em Ti, que também eles estejam em Nós, para que o mundo creia que Tu Me enviaste».